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Secretaria de Segurança Pública do Estado do Piauí
Nota técnica - Por que Teresina não pode ser considerada a 38ª cidade mais violenta do mundo?
17/04/2017 - 15:46  
  
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Nota técnica - "Por que Teresina não pode ser considerada a 38ª cidade mais violenta do mundo?"

Recentemente a ONG mexicana Seguridad, Justicia y Paz divulgou a pesquisa intitulada “As 50 cidades mais violentas do mundo”, baseada em dados de homicídios registrados em 2016, nas cidades do mundo com mais de 300.000 habitantes.
Nesta pesquisa, concluiu-se que Teresina é a 38º cidade mais violenta do mundo. Apesar da capital do Piauí ter saído da 20º posição em 2014 para a 38ª em 2016, faz-se necessário tecer alguns questionamentos sobre o estudo em tela, especialmente, no que tange a sua metodologia aplicada, de modo a propiciar ao leitor um embasamento sólido que possibilite a identificação das 50 cidades com as maiores taxas de homicídio no mundo.
Em se tratando de Teresina, a referida pesquisa utilizou-se como fonte os registros oficiais da Secretaria de Segurança Pública do Estado do Piauí, publicados periodicamente em sua página oficial. Ressalte-se, porém, que existem, nesta pesquisa, questões metodológicas que devem ser melhor explicitadas, sob pena de comprometer sua interpretação e seu objetivo primordial, que é o de estabelecer um ranking mundial dos municípios com maiores taxas de homicídio.  
A seguir passa-se a expor, em síntese, as principais críticas à pesquisa:

1.  Verificou-se a exclusão das cidades com menos de 300.000 habitantes. Aprofundando a leitura dos critérios de seleção na pesquisa em questão, percebe-se que foi excluída de sua análise as cidades com menos de 300.000 habitantes, sob a alegação de que esta categoria de cidades não representa o fenômeno da violência letal urbana. 
Ora, se a pesquisa pretende retratar o fenômeno do homicídio no mundo, esta exclusão não encontra respaldo, pois o critério adotado para estabelecer o ranking das cidades mais violentas do mundo é a taxa de homicídios por 100.000 habitantes e não seus números absolutos.
Desta forma, não existe razão para exclusão dessas cidades, pois a adoção da taxa de homicídios por 100.000 habitantes relativiza esta informação, levando-se em conta sua população local, viabilizando-se, assim, a comparação deste fenômeno criminal entre cidades com realidades demográficas distintas. Portanto, com a utilização desta taxa acima mencionada, torna-se capaz a correção de eventuais distorções decorrentes das diferenças populacionais.
Tal fato é confirmado numa rápida releitura do Mapa da Violência dos Municípios Brasileiros em 2008 (WAISELFISZ, 2008). Observou-se que das 25 cidades brasileiras com maiores taxas de óbitos por agressão em 2008, apenas 7 possuem mais de 300.000 habitantes, com base na população estimada em 2016 publicada pelo IBGE, demonstrando, assim, a importância da investigação dos homicídios nas cidades brasileiras com menos de 300.000 habitantes.
 Apesar do título sugestivo empregado na pesquisa, o mesmo proporciona uma generalização, podendo passar para o leitor despercebido a ideia de que todas as cidades do mundo foram pesquisadas. Assim, se a pesquisa pretende retratar os homicídios nas cidades do mundo, deve-se considerar os centros urbanos com menos de 300.000 habitantes. Desta maneira a pesquisa se tornaria legitima para conclusões sobre a magnitude mundial do homicídio.

2. A pesquisa não deixa claro se todas as cidades pesquisadas possuem os mesmos critérios ou, ao menos, similares para definição e quantificação do seu objeto de estudo, qual seja, o homicídio.
 Inicialmente, segundo a pesquisa, foram adotadas as definições universais de homicídios, porém não existem dados complementares capazes de identificar, por exemplo, a unidade de contagem utilizada nas cidades pesquisadas, pois é sabido que existem duas formas de contagem comumente utilizadas: o número de vítimas e o número de ocorrências (quando no mesmo fato foram vitimadas mais de uma pessoa e, mesmo assim, somente é registrado um único homicídio).
Em Teresina, a unidade de contagem é a mesma preconizada pelo Protocolo de Bogotá sobre a Qualidade dos dados de homicídio para América Latina e o Caribe, ou seja, a vítima.
O segundo aspecto observado diz respeito à falta de clareza quanto à natureza dos crimes contabilizados, pois no exemplo de Teresina, a pesquisa afirma que a informação de homicídios tem como fonte a Polícia Civil do Estado do Piauí, contabilizando 363 homicídios. Tal fato necessita de maiores esclarecimentos, pois os números divulgados referem-se aos crimes violentos letais intencionais- CVLIS, os quais englobam os crimes de homicídio doloso, roubo seguido de morte (latrocínio), lesão corporal seguida de morte e o estupro seguido de morte. Desta forma, indaga-se as estatísticas divulgadas pelas cidades pesquisadas: tratam-se apenas de homicídios ou de CVLIS?
O terceiro e último aspecto, e talvez a mais grave falha metodológica observada quanto ao objeto, refere-se ao fato da pesquisa deixar expresso a exclusão da contagem de homicídios, os casos de mortes em operações de guerra ou as mortes legalmente justificadas cometidos por agentes da ordem em cumprimento da lei, estando, pois, em desacordo com o preconizado pelo Protocolo de Bogotá sobre a Qualidade dos dados de homicídio na América Latina e o Caribe, o qual determina que tais eventos letais devam ser contabilizados nas estatísticas de homicídio, como é realizado em Teresina.

3. Ademais, a pesquisa em questão, apresenta alguns dados decorrentes de previsões/estimativas/projeções, as quais foram realizadas em dados por vezes obtidos por mídia digital, sem a utilização de critério único e sem observância aos pressupostos da estatística. Os critérios estatísticos, como a definição de um modelo matemático, são de suma importância para definição de uma previsão estatisticamente confiável. O estudo usa de estatística empírica para realizar previsões de homicídios, ou se baseia em critérios próprios, que, por não serem claramente explicados, não se pode concluir que seguiram as normas para uma produção consistente de dados criminais. Em nenhum momento foi levantada a possibilidade de um modelo de previsão para os dados, não sendo possível determinar a consistência de tais estimações. Assim faz-se necessário para se estabelecer a magnitude dos homicídios no mundo, considerar cálculos decorrentes de dados reais e não estimados, tornando-se inviável a construção de um ranking baseado na análise de dois tipos de variáveis distintas (as reais e as estimadas). O uso da estatística empírica para um estudo de grande relevância não deve ser considerado, tendo em vista os impactos negativos que os resultados obtidos podem causar para a sociedade.

4. Por fim, conclui-se que as inconsistências aqui apontadas podem prejudicar a construção de um ranking mundial de homicídios, haja vista que o presente estudo não se baseou num critério objetivo único, ou ao menos em critérios similares, que permitiriam uma análise objetiva e uniforme das taxas de homicídios em todas as cidades do mundo.

Ass. Núcleo Central de Estatística e Análise Criminal (NUCEAC) da Secretaria de Segurança Pública do Estado do Piauí
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